Sou uma daquelas pessoas que foi tomada, definitivamente, pela falta de imaginação. Não teria nada de mal não fosse o definitivamente andar sempre de mão dada com o irremediavelmente. O irremediavelmente, por princípio, não deve ter remédio, não é assim? Não é que, nesta situação de pouca criatividade ou imaginação, eu esteja a procurar ativamente por um remédio para curar esta maleita, muito pelo contrário, preservo muito a falta que me faz a falta de imaginação. O que eu não gosto muito é de situações definitivas. Definitivamente, irremediavelmente, fatalmente, etc, são palavras que não definem em nada a realidade que, de forma empírica, podemos observar infinita e em constante mutação. Assim, nunca procuro remédios para as coisas que são, mas odeio quando alguém as tenta vender “definitivamente”.
Como estava a dizer, estou numa fase de falta de imaginação e, o que é engraçado, é que não tenho memória de quando ela, a fase, se iniciou. Deve ser sinal de que, provavelmente, sempre tive falta de imaginação, o que é bom. No meio disto tudo apenas o sempre, como já expliquei atrás, é mau.
Constatei este fato hoje, quando, por breves instantes, me pus a imaginar como seria a minha mulher de sonho. Comecei por pensar como teriam que ser os seus olhos, depois passei para o nariz e logo logo focalizei os lábios. Nada. Não havia azul marinho nem preto azeitona, empinado ou por empinar, rubro, brilhante, húmido ou quente que ajudasse muito à obra. Nenhum esboço conseguiu superar o que a realidade todos os dias me apresenta já de forma conjugada. A princípio pensei que imaginar olhos, narizes e lábios era uma empresa difícil por exigir muita especificidade e então voltei o meu pensamento, ou que me falta nele, a minha imaginação, para coisas mais amplas, maiores, menos particulares, mais à vista, e tentei imaginar o cabelo de sonho, o busto de fazer cair o queixo, o rabo de nos fazer ter quebras de tensão, as pernas de nos provocar brecas no olhar e constatei que também aí não havia meio de me surpreender ou de criar algo mais belo do que a natureza nos consegue deslumbrantemente apresentar. Decidi passar para coisas mais materiais e mais fáceis, vesti e despi gangas, entrei em modas mais clássicas e formais para logo passar para conjugações mais ousadas e casuais, acoplei óculos de sol, alguns redondos, outros mais ovais, outros a cobrirem metade da face, escuros e claros, para tratarem as miopias ou simplesmente para não deixarem cansar as vistas, vistinhas, moldei-os intelectuais ou mais informais, juntei um carro dos pretos, no início, para logo o passar a vermelho, desportivo, rasteirinho, dei-lhe cavalos quanto baste e com a cilindrada aumentei-lhe linearmente o volume, passei-o de desportivo a um todo-terreno, meti-lhe lá dentro umas botas de cavaleiro, perdão, de cavaleira, e a cavaqueira continuava na minha imaginação, um fato colado ao corpo, preto, um chapéu a proteger uns cabelos loiros, não, não, ruivos! não não, pretos pretos! também não, é claro que tem que ter cabelo mas chego à conclusão de que a cor não interessa muito, nem o tamanho, nem a forma, o que importa é a conjugação dos elementos, de todos os elementos, o que importa é o conjunto e a forma como ele se movimenta, o que importa verdadeiramente é o jeito, e é aí que a minha imaginação falha, ainda mais, muito mais, fatalmente.
Todos os dias, sem exceção, me deslumbro com as criações da natureza. Eu, que costumava dizer que era um homem que se apaixonava basicamente todos os dias devido ao simples fato de ser homem, chego hoje a uma outra conclusão, muito mais importante e real: Sou um homem que se apaixona basicamente todos os dias porque a minha imaginação de homem não consegue superar o que a natureza nos oferece como real.
Assim, e que isto não sirva para passar a ideia de que me estou a justificar, afirmo que o deslumbramento num homem não é um defeito, é apenas um coproduto da sua falta de imaginação.
Como estava a dizer, estou numa fase de falta de imaginação e, o que é engraçado, é que não tenho memória de quando ela, a fase, se iniciou. Deve ser sinal de que, provavelmente, sempre tive falta de imaginação, o que é bom. No meio disto tudo apenas o sempre, como já expliquei atrás, é mau.
Constatei este fato hoje, quando, por breves instantes, me pus a imaginar como seria a minha mulher de sonho. Comecei por pensar como teriam que ser os seus olhos, depois passei para o nariz e logo logo focalizei os lábios. Nada. Não havia azul marinho nem preto azeitona, empinado ou por empinar, rubro, brilhante, húmido ou quente que ajudasse muito à obra. Nenhum esboço conseguiu superar o que a realidade todos os dias me apresenta já de forma conjugada. A princípio pensei que imaginar olhos, narizes e lábios era uma empresa difícil por exigir muita especificidade e então voltei o meu pensamento, ou que me falta nele, a minha imaginação, para coisas mais amplas, maiores, menos particulares, mais à vista, e tentei imaginar o cabelo de sonho, o busto de fazer cair o queixo, o rabo de nos fazer ter quebras de tensão, as pernas de nos provocar brecas no olhar e constatei que também aí não havia meio de me surpreender ou de criar algo mais belo do que a natureza nos consegue deslumbrantemente apresentar. Decidi passar para coisas mais materiais e mais fáceis, vesti e despi gangas, entrei em modas mais clássicas e formais para logo passar para conjugações mais ousadas e casuais, acoplei óculos de sol, alguns redondos, outros mais ovais, outros a cobrirem metade da face, escuros e claros, para tratarem as miopias ou simplesmente para não deixarem cansar as vistas, vistinhas, moldei-os intelectuais ou mais informais, juntei um carro dos pretos, no início, para logo o passar a vermelho, desportivo, rasteirinho, dei-lhe cavalos quanto baste e com a cilindrada aumentei-lhe linearmente o volume, passei-o de desportivo a um todo-terreno, meti-lhe lá dentro umas botas de cavaleiro, perdão, de cavaleira, e a cavaqueira continuava na minha imaginação, um fato colado ao corpo, preto, um chapéu a proteger uns cabelos loiros, não, não, ruivos! não não, pretos pretos! também não, é claro que tem que ter cabelo mas chego à conclusão de que a cor não interessa muito, nem o tamanho, nem a forma, o que importa é a conjugação dos elementos, de todos os elementos, o que importa é o conjunto e a forma como ele se movimenta, o que importa verdadeiramente é o jeito, e é aí que a minha imaginação falha, ainda mais, muito mais, fatalmente.
Todos os dias, sem exceção, me deslumbro com as criações da natureza. Eu, que costumava dizer que era um homem que se apaixonava basicamente todos os dias devido ao simples fato de ser homem, chego hoje a uma outra conclusão, muito mais importante e real: Sou um homem que se apaixona basicamente todos os dias porque a minha imaginação de homem não consegue superar o que a natureza nos oferece como real.
Assim, e que isto não sirva para passar a ideia de que me estou a justificar, afirmo que o deslumbramento num homem não é um defeito, é apenas um coproduto da sua falta de imaginação.