Hoje, um dia depois do “Ele há cada uma” (ver texto seguinte), tive um dia mais ou menos parecido com o meu dia anterior, só que desta vez saí para a cidade, para ver burcas, mais cedo que ontem, durante a tarde, por volta das 4 ou 5. Nada de especial se passou tirando o facto de validar que aqui, neste deserto de ideias, a forma mais criativa de marcar encontros é através do bluetooth. Nunca o meu telemóvel apanhou tantos bluetooths como aqui. Já tinha ouvido falar que esta era a táctica mais conhecida de engate em Riade, depois que os quéflô foram banidos, mas hoje pude em loco constar. Alguns anos antes do pouco romântico bluetooth os meninos vestidos de branco mandavam mensagens e marcavam encontros com as meninas vestidas de preto pelo quéflô. Ora a tecnologia aqui criou um meio mais barato de alcançar o mesmo objectivo.
Enfim, depois de um hambúrguer que prometi derreter com uma hora de ginásio vim para o hotel, pus o correio electrónico em dia, vesti-me a rigor e fui para o salão fazer uma corridinha apenas, sem sauna, porque gato escaldado de água fria tem medo embora o hospedeiro do quarto 1080 já estivesse a milhas do local uma vez que no dia anterior me dissera que deixava o hotel da parte da tarde.
Regressei ao quarto e voltei à minha caixa de correio electrónica que, agora, para além alguns anúncios publicitários, nada de relevante continha. Tomei um sumo de limão para repor as energias e fui para a casa de banho, começando aí o meu Biliões e Biliões do Carl Sagan. Os Livros são como as mulheres e as mulheres são como as cidades e as cidades são como as substâncias químicas, há umas que são laxantes, há outras que como a cafeína são estimulantes, há as que como a valeriana são relaxantes ou calmantes, depois há as chamadas placebo que parecendo tudo não são nada. Os livros também são assim. Em geral os que começo na casa de banho não me têm desiludido. Entro no banho.
Ora ainda nem uns 30 segundos de água tinha eu desperdiçado e eis que o telefone toca. Saio a pingar do chuveiro e atendo um pouco irritado por me terem feito sair do banho. - Yes. - Is it from room 1097? - Yes, it is. - Hello, I am Viswas from room 1081. 1081, isto deve ser uma brincadeira, o outro palerma estava, segundo o mesmo, no 1080. - Wiswas, what viwas?! Digo já quase a explodir. - We met yesterday in the sauna. Ah, ok, digo, apenas perplexo, quando o gajo me tem a ousadia de perguntar Are you free now. O meu cérebro sem que eu o conseguisse controlar, começou a tentar fazer a tradução de “vai para a puta que te pariu” directamente de um português do norte para um inglês americanado para o som sair mais suave, mas não conseguiu. Haverá alguma tradução para portuguesíssimo vai prá puta que te pariu? Eu penso que não. São estes produtos portuguesíssimos, sem tradução possível, que devem ser exportados, em favor da nossa pobre economia. O americaníssimo Shut the fuck up também tem poder como o vai prá puta que te pariu mas perde por ser menos provinciano. Enfim, tentando ver onde a ousadia do jovem ia chegar disse-lhe, ok, but I don’t need anything from you, elevando a voz um pouco no final. - Ah, ok, ok, I am leaving today at 11, it is just to tell you I hope to see you next time. - Ok, have a nice trip back and see you, e bati com o telefone, com a mesma intenção de quem vai ao focinho a alguém.
O que mais me irritou no meio desta história toda, para além desta minha incapacidade de dizer logo NÃO no primeiríssimo momento, foi o facto de pensar o que terá a minha cara ou a minha boa disposição ou a minha personalidade ou o meu sorriso ou o meu movimento ou a minha forma de estar que possa dar indicações a uma pessoa de que estarei disposto para receber assim massagens a torto e a direito. Eu, que pensei que dava ares de antipático.
Ele há cada uma!