sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Ele há cada uma! (A saga continua)

Hoje, um dia depois do “Ele há cada uma” (ver texto seguinte), tive um dia mais ou menos parecido com o meu dia anterior, só que desta vez saí para a cidade, para ver burcas, mais cedo que ontem, durante a tarde, por volta das 4 ou 5. Nada de especial se passou tirando o facto de validar que aqui, neste deserto de ideias, a forma mais criativa de marcar encontros é através do bluetooth. Nunca o meu telemóvel apanhou tantos bluetooths como aqui. Já tinha ouvido falar que esta era a táctica mais conhecida de engate em Riade, depois que os quéflô foram banidos, mas hoje pude em loco constar. Alguns anos antes do pouco romântico bluetooth os meninos vestidos de branco mandavam mensagens e marcavam encontros com as meninas vestidas de preto pelo quéflô. Ora a tecnologia aqui criou um meio mais barato de alcançar o mesmo objectivo.
Enfim, depois de um hambúrguer que prometi derreter com uma hora de ginásio vim para o hotel, pus o correio electrónico em dia, vesti-me a rigor e fui para o salão fazer uma corridinha apenas, sem sauna, porque gato escaldado de água fria tem medo embora o hospedeiro do quarto 1080 já estivesse a milhas do local uma vez que no dia anterior me dissera que deixava o hotel da parte da tarde.
Regressei ao quarto e voltei à minha caixa de correio electrónica que, agora, para além alguns anúncios publicitários, nada de relevante continha. Tomei um sumo de limão para repor as energias e fui para a casa de banho, começando aí o meu Biliões e Biliões do Carl Sagan. Os Livros são como as mulheres e as mulheres são como as cidades e as cidades são como as substâncias químicas, há umas que são laxantes, há outras que como a cafeína são estimulantes, há as que como a valeriana são relaxantes ou calmantes, depois há as chamadas placebo que parecendo tudo não são nada. Os livros também são assim. Em geral os que começo na casa de banho não me têm desiludido. Entro no banho.  
Ora ainda nem uns 30 segundos de água tinha eu desperdiçado e eis que o telefone toca. Saio a pingar do chuveiro e atendo um pouco irritado por me terem feito sair do banho. - Yes. - Is it from room 1097? - Yes, it is. - Hello, I am Viswas from room 1081. 1081, isto deve ser uma brincadeira, o outro palerma estava, segundo o mesmo, no 1080. - Wiswas, what viwas?! Digo já quase a explodir. - We met yesterday in the sauna. Ah, ok, digo, apenas perplexo, quando o gajo me tem a ousadia de perguntar Are you free now. O meu cérebro sem que eu o conseguisse controlar, começou a tentar fazer a tradução de “vai para a puta que te pariu” directamente de um português do norte para um inglês americanado para o som sair mais suave, mas não conseguiu. Haverá alguma tradução para portuguesíssimo vai prá puta que te pariu? Eu penso que não. São estes produtos portuguesíssimos, sem tradução possível, que devem ser exportados, em favor da nossa pobre economia. O americaníssimo Shut the fuck up também tem poder como o vai prá puta que te pariu mas perde por ser menos provinciano. Enfim, tentando ver onde a ousadia do jovem ia chegar disse-lhe, ok, but I don’t need anything from you, elevando a voz um pouco no final. - Ah, ok, ok, I am leaving today at 11, it is just to tell you I hope to see you next time. - Ok, have a nice trip back and see you, e bati com o telefone, com a mesma intenção de quem vai ao focinho a alguém.
O que mais me irritou no meio desta história toda, para além desta minha incapacidade de dizer logo NÃO no primeiríssimo momento, foi o facto de pensar o que terá a minha cara ou a minha boa disposição ou a minha personalidade ou o meu sorriso ou o meu movimento ou a minha forma de estar que possa dar indicações a uma pessoa de que estarei disposto para receber assim massagens a torto e a direito. Eu, que pensei que dava ares de antipático.   
Ele há cada uma!

Ele há cada uma!


Depois do ginásio fui para sauna para perder ainda mais água que aqui se bebe aos litros. Na sauna estava lá um jovem bem-parecido com traços de indiano, comissário de bordo, vim mais tarde a saber. Depois de me dizer que a sauna estava demasiado quente sai-se com esta: Queres que te faça uma massagem?
Eu pensei que não tinha ouvido bem. Uma massagem? gaguejei. Sim, se quiseres eu faço-te uma massagem. Tentei pensar positivamente e lembrei-me de lhe perguntar se ele tinha alguma formação especial em massagens e tal, pensando que talvez fosse massagista, sendo que assim justificava aquela abordagem. Foi aí que ele me disse que era comissário de bordo da Air Índia e que começou a cena das massagens porque andar de avião gera muito stress e ele quis aprender a fazer para se auto-massajar, se bem que na minha terra isto de auto-qualquer-coisa é sempre sinónimo de masturbação, se não é física é intelectual ou espiritual, e continuou dizendo que depois descobriu, grande iluminado! que a coisa não funcionava porque os pontos principais da massagem são a zona lombar, o fundo das costas e o pés, e que agora aproveitava o conhecimento para fazer aos amigos, “for free” (grátis), teve o cuidado de informar logo desde o início, não fosse o negócio não ficar bem esclarecido. Ora, entretanto, com tanta conversa, eu já estava a pensar que me tinha safado de assunto tão delicado, mas, a cena voltou ao mesmo, se quiseres eu faço-te uma massagem, ao que, assim de repente, lhe respondi, para não ser mal-educado, que estava bem, que fizera uma massagem a semana passada e que estava a sentir-me muito bem, sem stresses. Esta minha coisa (merda) de não saber dizer que não às pessoas só me lixa a vida e me empata, para além de empatar os outros, como iremos ver, pois, o jovem hospedeiro não se contentando com a minha não resposta lá me disse, estou no quarto 1080 (vou tentar evitar esse quarto ao máximo nas minhas próximas estadias) e se quiseres posso fazer-te lá uma massagem. Já me estava a irritar a palavra massagem! Mas ele não dava espaço e perguntou-me o número do meu quarto. Estou lixado com F dos grandes, no sentido literal da palavra, pensei, mas mais uma vez não lhe consegui dizer que não tinha nada que saber o número do meu quarto, e disse-lhe, olha, estou perto do teu, estou no 1079. Ele, eufórico exclamou que é mesmo ao lado.
Entretanto o hospedeiro, vendo que a insistência estava a ser despropositada prosseguiu com outra táctica mais indirecta mas mais cativante para os cliente, Andas no ginásio, disse, tens o corpo bem feito sem ser demasiadamente musculado. Eu ali com a barriga ao léu e com aqueles calções de licra ridículos que me faziam sobressair a zona genital pensei para com os meus botões, olha-me este cabrão a dizer bem do meu corpo quando estou com uma barriga destas, e lá continuámos a falar de músculos acima e abaixo até que decidi vir-me embora por não aguentar conversa tão gay num sítio que ali está completamente reservado a homens.
Quando cheguei ao meu quarto já a pensar na forma como ia desligar o meu telefone para o gajo não me chatear e tenho a feliz e visual notícia: O número do meu quarto era o 1097 e não o número que lhe tinha dito, o 1079. Engano-me muitas vezes nestas coisas de números, sou ainda pior do que o nosso maravilhoso governo. E pronto, lá fiquei mais descansado, tomei o meu banhinho, pus o meu perfume e decidi ir ver burcas para o centro comercial e, já agora, jantar. Voltei tarde ao quarto, eram já umas 23:30. Passado nem 10 minutos e o telefone começa a tocar. Como tinha acabado de pedir para me substituírem o frigorífico que não funcionava pensei o quanto injusto por vezes era com o staff do hotel. Estou? Olha, eu sou aquele que conheceste na sauna. Queres que passe aí para te fazer uma massagem? Ah grande put* de massagem que agora já estava a ser demais! e pensei, como foi que o cabrão arranjou o número do meu quarto mas depois apenas lhe disse, olha, há bocado enganei-me no número afinal é o 1097 e não o 1079. E ele lá insistiu na massagem e eu lá entrei com novas desculpas dizendo que estava à espera de uma chamada e que essa chamada ia durar muito tempo e que não podia estar ali com o telefone ocupado. Perguntou-me se queria que ma fizesse de manhã uma vez que de tarde estava programado ir-se embora. Eu disse-lhe que não que dependendo da chamada que ia receber provavelmente amanhã de manhã iria ter que sair.
Agora estou no quarto com a put* da porta com o loquete por dentro e a meditar o sermão que lhe vou passar se o homem se lembrar de me acordar de manhã, uma vez que conto estar a ver o lost (série 2) até a altas horas da noite.
Desliguei, entretanto, os cabos dos telefones para não ser importunado.
Um gajo acontece-lhe cada uma!