quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A Literatura de Direito

Na notícia do DN (em: http://www.ionline.pt/conteudo/72397-freeport-pinto-monteiro-conhecia-despacho-acusacao) pode ler-se excertos do despacho feito pela directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) sobre o caso Freeport. Algures lá para o meio ela diz assim, "Concedendo-se o interesse na inquirição de Sua Excelência, o senhor primeiro-ministro, e do senhor ministro de Estado e da Presidência [Pedro Silva Pereira], à data dos factos ministro do Ambiente e secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, respectivamente, certo é que das suas respostas eventualmente obtidas não resultariam alterações de fundo aos juízos indiciários, próprios desta fase, que subjazem ao despacho de arquivamento e de acusação ora deduzidos", e depois continua, "Confirmando a minha informação telefónica, de ontem, a Sua Excelência, o procurador-geral da República, sobre o teor do despacho final proferido pelo Ministério Público nestes autos, remete-se-lhe cópia do mesmo, em confidencial e com nota de urgente".
Frases como estas, com vírgulas rebuscadas mesclando sem mácula sujeitos com predicados, pretéritos com perfeitos, perfeitas! prefeitas? não são empresa que qualquer poetazito da nossa praça consiga executar. Isto é trabalho de verdadeiros crânios da literatura nacional.
Luís de Camões, Eça de Queirós ou mesmo Fernando Pessoa fariam vénias 30 vezes por dia a tão perfeitas perfeitas literaturas. A perfeição da escrita perfeita dos advogados e juízes da nossa praça está na escrita em si, nas frases, nas vírgulas e nos pontos, e não no surrealismo potente e criativo por eles descrito, que esse, como todos nós zéstugas sabemos, está em nível muito mais elevado quando comparado com os mais sublimes trabalhos dos melhores surrealistas franceses.
Lendo-se atentamente um trabalho como o anterior só se pode ficar irremediavelmente sem fôlego. Aquilo é preciso jogo de cintura para se conseguir fintar tantas vírgulas e excelências saindo-se ileso de tão espontânea dança.
Aqui, o comum zétuga pergunta, não poderiam vossas excelências da literatura portuguesa dizerem literalmente porque encerram os casos sem ouvirem os indiciados? Assim, preto no branco, sem rodeios: Encerrado, e pronto!

Sem comentários: