domingo, 19 de junho de 2011

Quem escorrega também cai

Quem caiu também escorregou
Mogwai - Yes, I am a ling way from home

Há provérbios e provérbios, como há ditos e ditos, uns válidos e comprovados pela experiência e outros onde a validade é dúbia ou, no mínimo, discutível. Ora o quem “escorrega também cai” era um dos ditos que eu considerava pouco aplicável à realidade. Quem escorrega, dizia, pode ainda assim não cair.

Acabo de me certificar que cheguei há muito à idade em que quem escorrega cai, definitivamente. Será que os provérbios têm um aplicação por escalões etários? do tipo, até ao 35 anos quem escorrega pode ainda assim não cair, depois dos 35  quem escorrega também cai, será? sei lá!

Eu acho que é como digo.

Faz 3 semanas que escorreguei e caí duas vezes seguidas enquanto preparava uma, como na minha terra se diz, frangalhada para os amigos. Para além de o facto de as escorregadelas serem de uma forma tal – forma tal para a minha idade - que não pude evitar cair, ao contrário do que me acontecia nos tempos em que a minha condição me dava uma agilidade que me permitia evitar o tombo mesmo a 5 centímetros de chegar ao chão, constatei ainda outro facto que me permite afirmar que cheguei à idade em que “quem caiu também escorregou”, uma bela forma de dizer que nesta idade não nos podemos dar ao luxo de cair por cair ou cair pelo sabor da experiência. Cheguei à idade em que “quem caiu também escorregou” ou à idade em que não se nos é permitido cair.

Quando se tem 15 anos, aparecer a coxear na frente dos amigos e amigas é um sinal de valentia. Aí as mazelas provocadas por uma queda são estimadas, cultivadas, fingidas e prolongadas até ao ponto em que os outros nos continuam a olhar como quem olha um rebelde, um herói, um guerreiro acabado de conquistar a guerra. É esse olhar de fascínio dos outros que faz com que as escorregadelas possam ser com ou sem queda, sobre o nosso desígnio e controlo. Somos uma espécie de pequenos deuses das escorregadelas. O mundo e a natureza aí são perfeitos, caímos e levantamos tantas vezes quantas nos der na gana. Recuperar de um entorse faz-se em menos de um dia, com ou sem gelo, com ou sem erodoide(?), o corpo facilmente se transforma de uma máquina de força e agilidade numa fábrica de produção de antinflamatórios. É deslumbrante e  belo.

Quando se chega à minha idade, uma pequena queda provoca o maior dos danos. Os seguros de saúde e acidentes pessoais passam a fazer todo o sentido, e deviam ser mais caros e obrigatórios. Primeiro, é limpinho que “quem escorrega também cai”, segundo, à “primeira quem quer cai à segunda só cai quem quer” passa a ser uma máxima claramente falsa, terceiro, o “levanta-te e anda” da época de Jesus passa a ser completamente impossível na idade dos que não podem sequer escorregar. E isto passa a ser válido para todos os aspectos da nossa vida, dos mais físicos aos mais espirituais.

Se aparecemos a coxear os olhares de quem não nos conhece passam a transmitir um sentimento que nada tem a ver com fascínio. Quando aos 15 nos sentimos os heróis, depois dos 35 passamos a sentirmo-nos deficientes, manquinhos, coitadinhos. Enquanto aos 15 se cura um entorse em menos de 24 horas, depois dos 35 pode levar meses a curar, pior, para não forçarmos a dor acabamos por magoar  todas as outras articulações. É uma bola de neve. Comigo começou com um pequeno entorse que logo passou a dores fortes no joelho, as dores na anca vieram logo a seguir e as costas já começaram as manifestações de desconforto. Quando se escorrega depois dos 35, não há nada a fazer. Parar é o único, demorado e incerto remédio. Fisicamente funciona assim: poucas coisas funcionam, mas há pelo menos ainda a incerteza da recuperação. Na outras áreas é trinta vezes pior, a certeza de que jamais nos levantamos é muito maior. Eu, que afirmo que a calma e a certeza são os sinais mais importantes de que a morte está perto, detesto as escorregadelas, porque me dão a certeza da queda e me lembram cada vez mais as dificuldades de me levantar.

12 comentários:

Anónimo disse...

Morte está perto e sozinho!

Kid A disse...

Há uma alma abandonada que aqui vem, às vezes, botar "faladura" sobre a vida dos outros, quando, em cada uma das suas palavras de cada um dos seus comentários há um cheiro a uma amargura nauseabunda.
Decidi publicar este comentário, porque apesar de não fugir muito a outros que não publiquei quero-o aproveitar para lançar algumas questões sobre ele, ou, para ser mais preciso, sobre o que ele diz, sobre a morte. Não sobre a vida que cada um sabe da sua e toma nelas as opções que bem quiser.
Será que existe verdadeiramente uma morte que não seja morrer sozinho? Será que morrer de mão dada em alguém ou no meio de uma multidão não é ainda assim morrer sozinho?
Pensem nisso. Eu tenho as minhas ideias, mas gostava de ouvir as vossas.

Anónimo disse...

Bem se é uma alma abandonada e amargurada, fizeste bem em colocá-lo aqui no meio da gente, para termos uma amena cavaqueira, aliás da discussão nasce a luz. lol
Primeiro quero dizer-te que adorei o texto, não me parti a rir porque estou um pouco mais á frente que tu e podia não recuperar mesmo, por isso tive algum cuidado. lol
Mas já que nos pedes opinião: Não vou perguntar quem "ele" é , mas porque não vem "ele" dar-nos a sua opiniao sobre a morte para que se faça luz sobre ela , já que a vida é tua e nem ele nem ninguem tem nada a ver com isso hum? Quanto a morrer sózinho de mãos dadas com alguem , depende de quem a morte apagar primeiro... Bom de qualquer forma acho que há muito mais gente morta durante a sua triste existência do que o que se imagina, mas conheço bastantes cujo azedume e amargura só não se envenenaram a si próprias porque só elas são imunes à sua maldade.

Já agora, a minha avó sempre disse que só podemos ter uma certeza : é que todos morremos um dia. Então se isso é certo para quê essa preocupação ? Hum? Vamos falar de coisas mais interessantes e das quais hajam duvidas ???

Beijo

B.

Anónimo disse...

"Morrer é incontestávelmente um acto de absoluta solidão; todos morremos sózinhos, por muitos que nos rodeiem; por essa ser uma realidade incontornável, e irmos passar muitos anos mortos, é que é importante não estar só enquanto estamos vivos;o Homem não é uma animal solitário por natureza, daí o grande medo da morte na nossa cultura, pela ida para o desconhecido, sem ninguém..."


B.

jacklyn disse...

Caga na morte. Concentra-te em viver. Comme il faut.

Anónimo disse...

Apoiado!!!!

Vive e deixa viver!!!

Cmpts


B.

Anónimo disse...

Estas errado!
Ter nascido para ter essa vida, não era necessário.Que tempo perdido!

Kid A disse...

Sem comentários...

Anónimo disse...

Inveja, sentimento feio... ver significado no dicionário e, à falta deste, pt.wikipedia.org

Matilde

Anónimo disse...

Éh láááááá, isso é que é azedume.
Bem... às vezes enerbasme, mas não te quero morto, pq se não existisses eu não me ria tanto de vez em qdo.
Que lhe fizeste Kid?
Ou não fizeste?

ehehheh
Beijo

B.

jacklyn disse...

A trama adensa-se... Lol.

J. disse...

"You have to die a few times before you can truly live"

Charles Bukowski