domingo, 27 de setembro de 2009

Desfiz-me delas

Desfiz-me delas para sempre. Confesso que me custou deixá-las. Elas criaram durante uma longa semana um ambiente de presença constante e fervorante no meu pequeno apartamento. Não é todo o dia que nos apegamos a uma calcinha 89% Nylon, aproveito aqui para corrigir os valores da percentagem onde no primeiro texto se descrevia que a cueca tinha 98% nylon, 8% elastime e 3% cotton o que daria uma cueca marciana de 109%, bem, como dizia, não é todos os dias que nos apegamos desta forma doentia a uma calcinha sem conhecermos a sua dona. Hoje, neste domingo quase solitário, ainda olho para o local onde comodamente elas me observaram e zelaram durante toda uma semana que observada deste ponto foi breve. Tinha que ser, todas as relações começam e acabam, todas, sem excepção, tinha que ser, tento vincar o pensamento no meu ciclo de pensamentos, e quase fico conformado.

Ainda me lembro com se ontem fosse hoje dos passos que dei, dos receios que senti, do cenários que projectei, enquanto as carregava no bolso direito das minhas calças Salsa. Desci ao primeiro andar sem contar as escadas porque fui de elevador e cheguei sem demoras, depois, desci, e aqui não falho, 7 pequenas escadas para me encontrar ao nível da cave onde o pequeno centro de máquinas às vezes opera. Levei comigo outra remessa de roupa para lavar. A máquina, uma apenas, estava em funcionamento o que me levou a deixar o meu saco para mais tarde lá voltar. Meto as mãos ao bolso e sinto-as minhas. Observo pertinentemente que numa das esquinas do pequeno quarto se encontra uma cámara de filmar. Tiro a mão do bolso onde as sentia e levo-a ao queixo dando para a cámara aquele ar de reflexão. E agora, como vou fazer para abandonar aqui as calcinhas sem que mais tarde me venham dizer que me quedei com elas durante uma semana, pensei para com os meus botões sem que obtivesse uma resposta decente. Mantive o ar de reflexão e, talvez, por isso, fez-se luz. O saco de roupa suja estava sobre a mesa entre mim e a cámara e, com um pequeno jeito, qual David Copperfil ou David de Matos (não sei mas ou Coperfil está mal escrito ou o de Matos não é David. Não soa bem), poderia deixar as calcinhas entregues à sua sorte. Se bem o pensei melhor o fiz num movimento rápido mas que me prende o pensamento agora que passam quase 24 horas do facto. Ficaram com o formato da minha mão marcado nelas e elas deixaram o perfume Ariel na minha mão impregnado, uma troca de mimos que para além de justa foi sincera.

Quando regressei ao local, onde não se cometeu crime algum, elas ainda repousavam do meu aperto e a minha mão ainda cheirava a Ariel. Sem mais olhar para elas meti a minha roupa na máquina e prometi a mim mesmo não mais as voltar a observar. As relações só acabam quando não temos que nos prometer a nós mesmos que vamos esquecer, é o que contacto desta minha breve relação. Quando fui pegar a roupa lavada elas ainda lá estavam e foi a primeira vez que entre nós uma promessa foi quebrada.

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